Em 2003, o Brasil tinha 45 universidades federais, hoje tem 69 (6 em processo de implantação). Desde 2009, a rede federal de ensino superior conta também com 40 institutos federais (sendo 2 Cefets), com campi em mais de 600 municípios, que também ofertam graduação e pós-graduação. Veja acima o mapa da expansão.
Em 2008, a rede federal oferecia 3.235 cursos, em 2019 esse número dobrou (6.669 cursos). Quando falamos de matrículas no ensino superior de graduação, a rede federal saiu de 700 mil em 2008 para 1.335.254 em 2019 (1.114.468 em universidades e 214.843 em institutos federais). Importante salientar que os institutos federais ofertam cerca de 34% das suas matrículas no ensino superior, o restante (66% ou 685 mil matrículas) é ofertado na educação básica.
Diante dessa expansão significativa, seria razoável imaginar que os gastos do Ministério da Educação (MEC) também duplicaram nessa última década, certo? Contudo, a história não é exatamente essa.
O gráfico abaixo traz a execução orçamentária total (obrigatórios e discricionários) do MEC na última década, corrigida pela inflação. A maioria dos recursos do ministério são para as universidades e institutos federais (IFES) e para os hospitais universitários. Repare que mesmo com a expansão descrita acima, a despesa global caiu depois de 2014 e se mantêm estagnada nos últimos anos. Esse dado abarca o efetivamente pago e restos a pagar, em 2020 o valor executado foi de R$ 118,2 bilhões.
A principal despesa do MEC é a obrigatória, com pessoal e encargos sociais (salários de ativos e inativos), dado que para garantir a expansão da rede foi preciso realizar concursos públicos e, com o passar do tempo, aposentadorias vão ocorrendo. Hoje o MEC tem metade dos servidores civis ativos da União. Abaixo o gráfico da despesa de pessoal, corrigido pela inflação, a despesa em 2020 foi de R$ 72 bilhões.
Em contraste com esse esperado aumento do gasto de pessoal, o gráfico a seguir mostra o gasto discricionário (custeio das IFES e investimentos) do Ministério da Educação com universidades e institutos federais. Note que a queda é significativa nos últimos anos, sendo a aplicação de 2020 de R$ 12,2 bilhões.
Hoje o número de instituições, cursos e alunos da rede federal é bem maior do que há 10/15 anos. Isso significa bem mais gastos com custeio básico (água, luz, segurança, limpeza, insumos, manutenção, bolsas) do que antes. Porém, o patamar de recursos para isso hoje é menor que o de 2010.
Sobre investimentos (gasto discricionário retirando o de custeio), o cenário é pior ainda, os campi que estão em implantação, que precisam fazer obras, adquirir mobiliário, equipamentos são os mais prejudicados. Para universidades antigas, o restauro e os reparos ficam inviáveis também. O gráfico abaixo é ilustrativo, ele filtra os recursos de investimento nas IFES, nota-se que a aplicação sai de mais de R$ 12 bilhões em 2012 para R$1,7 bilhões em 2020. Essa reportagem da Folha de São Paulo, da qual participei, trata disso também.
Aqui está dado o dilema orçamentário que vivemos. Como vimos, hoje o número de instituições, cursos e alunos da rede federal é bem maior do que há dez ou quinze anos. Isso significa bem mais gastos com custeio básico (água, luz, segurança, limpeza, insumos, manutenção, bolsas) do que antes. Porém, o patamar de recursos para garantir a manutenção das IFES hoje é menor do que o de 2010. Como dar conta de consolidar e ampliar a rede federal diante da inviabilidade de manter instalações e programas funcionando?
É importante conhecer a ordem de grandeza das questões orçamentárias. É impossível ampliar cursos ou mesmo finalizar o projeto de expansão em muitas instituições se o Ministério da Educação tiver a mesma execução orçamentária global de 2012/2013. Com a expansão de vagas e inclusão via ações afirmativas, a demanda por assistência estudantil cresceu, isso requer recursos, o mesmo vale para o combate a evasão, a garantia de inclusão digital e as necessárias adaptações para o contexto pós-pandemia.
No gráfico abaixo consta a execução orçamentária (corrigida pela inflação) de ação referente a assistência estudantil nas universidades federais na última década. O crescimento de recursos acompanha o crescimento de matrículas até 2016, depois a verba da assistência cai e se estabiliza. Nos últimos 10 anos, a rede federal aumentou em 59,1% o número de alunos matriculados (4,8% a.a.), mas o ritmo de crescimento se reduziu nos últimos três anos, muito em função dos contingenciamentos orçamentários que inibem a criação de cursos e ampliação de vagas pelas IFES. Importante frisar que nesse gráfico não está incluída a assistência estudantil dos estudantes de ensino superior dos institutos federais, estes são vinculados a ação orçamentária referente a educação profissional.
Com a estagnação dos concursos, o gasto de pessoal deve se estabilizar nos próximos anos, mas o fato dele ter crescido com a expansão da rede (o que era de se imaginar, pois educação se faz com recursos humanos), não pode ser justificativa para o sucateamento completo das IFES, isso inviabiliza a ciência, a inovação e o ensino superior público de qualidade no Brasil.
É necessário proteger os recursos discricionários das IFES, ou seja, o recurso de custeio, manutenção e investimentos para consolidar e expandir a oferta do ensino superior público que ainda tem participação modesta no total das matrículas no Brasil.
A reboque deste tema, podemos ainda tratar do esvaziamento do financiamento da ciência e tecnologia nos últimos anos no Brasil. Para isso, me valho da execução orçamentária das duas agencias de fomento nacionais, a CAPES e o CNPQ.
Começando pela CAPES, o gráfico traz o dado pago com restos a pagar incluídos, o orçamento executado chegou a ser de mais R$ 10 bilhões em 2015 e caiu para R$ 3,8 bilhões em 2020.
O CNPQ experimenta situação semelhante, chegou a aplicar mais de R$ 3 bilhões em 2013 e executou apenas R$ 1,2 bilhão em 2020, conforme gráfico abaixo.
Esses dados demonstram, de forma inequívoca, que a educação superior federal e o fomento a pesquisa que ocorre em sua pós-graduação, depois de uma expansão expressiva e do incremento de pessoal e recursos até 2015, vêm experimentando uma drástica redução orçamentária. Tal cenário coloca em xeque a oferta de educação superior pública de qualidade e restringe a possibilidade de ampliação da rede pública como alternativa para intensificar a democratização do acesso a esse nível de ensino.