O debate sobre a data de realização do ENEM se iniciou quando da eclosão da pandemia no Brasil, em março do ano passado. O MEC chegou a fazer uma consulta com os inscritos que em maioria escolheram o mês de maio de 2021. Apesar disso, o governo definiu pelo mês de janeiro para aplicar a prova.
No meio do ano passado argumentávamos que janeiro poderia culminar com a segunda onda da Covid-19, que a Europa já começava a viver, e que a gravidade da situação seria intensificada pelas festas de final de ano. Não deu outra, estamos em outro grande pico de contágio, com número de internações e mortes aumentando e muitas regiões do país estão com seus sistemas de saúde colapsados.
O apelo de entidades estudantis, de infectologistas, dos secretários estaduais de saúde, de prefeitos, do Ministério Público Federal (em Manaus) e de especialistas em educação pelo o adiamento do ENEM é legítimo e correto. Porém, a definição do Enem para janeiro representa mais um capítulo de toda a dificuldade do governo federal de fazer o que é elementar para impedir a expansão do coronavírus.
Realizar o ENEM nessas condições implica em colocar milhões de pessoas em risco, infelizmente. Em maio teríamos a vacinação já iniciada, mais tempo de preparação para os alunos que ficaram sem aulas em 2020 e uma situação sanitária menos grave.
Além disso, há o efeito psicológico nos estudantes e familiares. O medo de se contaminar se junta a toda angústia produzida pela dificuldade de acessar o ensino remoto durante a pandemia. Muitas redes de ensino, apenas perto do fim do ano é que conseguiram se organizar minimamente em termos de oferta de atividades e o calendário letivo de 2020 ainda está sendo pensado.
O ENEM será feito em um contexto em que a desigualdade educacional se ampliou, o mesmo ocorrendo com a evasão escolar. Socialmente falando, ele coincide com o mês em que se encerrou o auxílio emergencial para milhões de famílias, o que afeta os estudantes mais pobres. Diante de todas essas inseguranças, o ENEM deve ter uma abstenção significativa e reproduzir inequidades de maneira ainda mais intensa do que já faz.